RResenha
Livro: A mãe, a filha e o
espírito da santa
Autor: P. J. Pereira
Ano:2017
Nº de páginas: 496
Editora: Planeta
P. J. Pereira, autor da
trilogia Deuses de dois mundos, lança mais uma obra prima da literatura
nacional. Me interessei pelo livro logo que li seu título. Quando fui buscar
saber mais sobre a história, fiquei completamente apaixonada. Procurei bastante
e consegui adquiri-lo em uma promoção de uma livraria.
O livro conta a história
do novo messias, ou melhor, nova, Pilar da Anunciação. Nascida no Maranhão, na
cidade de Codó, filha de Maria e três anjos, em meio a uma família praticante
do terecô, religião oriunda do Maranhão, que mistura preceitos da Encantaria e
Umbanda.
A obra é dividida em três
partes, homônimas das do título. A parte I, intitulada A mãe, conta a história
da concepção de Pilar e um pouco da vida de sua mãe Maria, ao mesmo tempo que
narra os primeiros períodos da infância da nossa messias. A segunda parte, A
filha, narra a adolescência e primeira fase adulta de Pilar, enquanto a parte
III, O espírito da santa, aborda especificamente a atuação de Pilar como líder
religiosa. Tudo isso embalado à uma trilha sonora escrita pelo próprio autor.
O livro trata, na minha
opinião, sobre preconceitos. De todos os tipos possíveis. Ao longo do enredo,
podemos perceber o preconceito da cidadezinha de Codó em relação à Pilar, pelo
fato dela ser menina e escolhida Messias; podemos observar o preconceito da
sociedade em relação aos praticantes de religiões de matriz africana; o
preconceito , novamente, das pessoas, quando são abordadas ao longo do livro
relações homossexuais.
Existem cenas muito
fortes, de abuso, violência, estupro, que podem impressionar os mais sensíveis.
Mas são cenas necessárias para a construção da trama. Tem muitas cenas de sexo
também, mas mostrando que o sexo é uma atividade normal da vida, assim como
comer ou dormir.
O que me deixou mais impressionada
foi a construção de todos os personagens: parecem tirados de algum filme, ou
série, ou mesmo da vida real, tamanha a verossimilhança. Pilar , sobretudo. Ela
é retratada como uma líder humana, que tem partes boas e ruins, que vão se
alternando ao longo do tempo. É necessário que estejamos livres de todo pudor
para conseguir acompanhar as tramoias que ela se mete. Por vezes amada, outras
odiada, mas, humana. As descrições dos cheiros, gostos, sentimentos são
meticulosas, detalhadas e novamente, cinematográficas. O tempo inteiro imaginei
uma adaptação para as telinhas ou telonas da obra.
Respira-se Brasil ao
longo de todo o livro. O autor, neto de nordestinos, escreveu o livro
utilizando gírias da região, o que causa uma maior imersão na história. Parece
que estamos ouvindo a conversa da boca dos personagens. Pude conhecer mais
sobre as diversas manifestações religiosas do nosso país e que não fazia a
mínima ideia. Além de poder conhecer melhor três locais: Maranhão, Brasília e
São Paulo, que são os espaços onde se desenrola a trama. Como a história
atravessa as décadas de 60,70,80 e 90, podemos sentir a inserção do tempo
através de sutilezas: a perseguição aos comunistas (qualquer um que discordasse
do governo ou lesse livros proibidos) na ditadura é um exemplo de marca da
temporalidade.
O próprio autor conta que
escreveu a história inspirado em casos de abuso religioso ao redor do mundo.
Vários profetas da fé se aproveitam da boa vontade alheia, para infligir
sofrimentos os mais variados possíveis e isso fica muito bem retratado no
livro: pessoas perdem empregos, casamentos, filhos, amigos, por se isolar em
uma religião que não permite contato com pessoas “de fora”.É um livro riquíssimo
culturalmente e esse caldo só poderia ter sido proporcionado por um autor
brasileiro de qualidade como P. J. Pereira. Recomendo fortemente a leitura.