Resenha
Livro: Éramos Seis
Autora: Maria Jose Dupré
Número de páginas: 192
Ano de lançamento: 1943
O romance retrata a vida da família de Dona Lola, uma
típica vida de dona de casa do começo do século passado. A história se
desenrola através de mais de duas décadas e a partir dela é possível acompanhar
as mudanças que a sociedade paulistana sofreu ao longo do anos .
Dona Lola vive com seu marido, Júlio, e seus quatro
filhos: Carlos, Alfredo, Julinho e Isabel. Todos com personalidades
incrivelmente diferentes entre si. Carlos sempre foi um menino amável,
estudioso, responsável e trabalhador, apesar de um pouco moralista, e isso é
até compreensível, visto que após a morte do pai ele passa a comandar a casa
juntamente com sua mãe, mas não avancemos muito; Alfredo é o que se pode chamar
de bom-vivã, não gosta de trabalhar nem de estudar, desde pequeno; Julinho
sempre gostou de guardar dinheiro e teve faro para os negócios e Isabel era a
menina vaidosa, garota dos olhos de ouro do pai.
Podemos acompanhar a trajetória dessa família, e
maneira tão bem descrita e construída, com personagens tão complexos, que
parece que estamos vivenciando uma história verdadeira, típica daquela época.
Julio era um marido machista, mas temos que pensar que o livro se passa nas
primeiras décadas do século passado, ou seja, olhar com a perspectiva atual
para esses personagens se constitui em anacronismo. Apesar de ser um marido
machista, deixar a educação das crianças na mão de sua esposa, viveu e se
dedicou ao máximo à sua família; passava
o dia inteiro trabalhando para conseguir sustentar a família e apesar de
ser um pouco sem jeito, meio durão, calejado pela vida, percebemos várias
atitudes de amor dele para com os filhos.
Vamos observando a vida da família pobre, pelos olhos
de Dona Lola. Uma personagem forte, dedicada mãe e esposa amorosa. Sempre fez
de tudo para ajudar o marido financeiramente. A família era muito pobre,
podemos observar o sacrifício deles para criar os quatro filhos.
O livro levanta algumas polêmicas da época. Naquele
tempo não existia a lei do divórcio, que data da década de 70. O que existia
era o desquite, mas a pessoa não poderia casar-se novamente. Isabel apaixona-se
por um homem desquitado, o que leva ao desgosto de sua família, que acaba não
aceitando aquele relacionamento. Apesar do preconceito e repulsa que sofreu,
Isabel leva seu amor adiante. O paralelo que consigo traçar é com os
relacionamentos homoafetivos atualmente, que em muitas famílias ainda são
tratados como algo anormal e visto de maneira pejorativa pela sociedade.
Espero
que um dia isso seja apenas uma lembrança de um tempo em que tivemos que lutar
por coisas óbvias. Assim como é super cotidiano hoje uma pessoa se divorciar,
torço para que os relacionamentos homoafetivos sejam encarados com essa
normalidade futuramente.
Outra polêmica levantada é sobre o comunismo. O
Alfredo em determinada época da vida começa a frequentar reuniões comunistas. A
gente acaba sentindo como era o tratamento dado a esse assunto na época.
Ninguém sabia de fato o que era o comunismo, mas eram contra e as pessoas eram malvistas
pela sociedade. Semelhança com a atualidade?
Carlos representa a moralidade cristã e tradicional.
Sempre vigiando os irmãos, tomando conta, ainda que em sua visão para o bem, da
vida de todos os irmãos, indo contra suas ações que ele considerava imorais.
Para mim, fica claro que ele representa a sociedade com seus preconceitos
arraigados. Mesmo assim, conseguimos entender essa responsabilidade que Carlos
carrega e ele era uma pessoa tão doce e amável, que era difícil ficar com raiva
dele.
Ao final da história, temos Dona Lola sozinha, sem
maridos, com seus filhos vivendo longe.
Por isso o título: éramos seis. No começo, eram seis pessoas na casa; muitas
brincadeiras, refeições na mesa, sacrifícios, mas acima de tudo, muito amor.
Podíamos senti-lo emanando naquela família. Ao longo dos anos, mortes
acontecem, separações, brigas, terminando a história somente com a matriarca da
família e toda a sua solidão, permeada por lembranças felizes e outras nem tanto
assim. Recomendo a leitura!